Coluna Piloto X: A oração da coragem

Por Sandro Mendes

A viagem mais marcante da minha vida fiz ao lado de Márcio Vanoni, um amigo brasileiro que morava na Itália. Foi no ano de 1999. Saí do Brasil de avião e o encontrei em Roma, de onde, a bordo de seu BMW 325, cortamos a Europa do Sul ao Norte.

Estivemos em Mônaco, onde percorremos o traçado utilizado no GP de Fórmula 1. Visitamos Maranello, a casa da Ferrari e estivemos na Alemanha para ver de perto as fábricas da Mercedes e da BMW. Fomos ao autódromo de Spa, na Bélgica e ao de Silverstone, na Inglaterra.

Foi uma viagem de 11 dias ao todo, típica de dois amantes do automobilismo, em que, entre outras distrações, fotografamos os mais belos carros que circulam pelo continente europeu.

Nessa época, Vanoni lutava contra um câncer. Jamais vou me esquecer do que ele me disse na ocasião:

– Vou morrer logo. Gostaria que você escrevesse algo para colocar no meu santinho (aquele panfleto que as famílias católicas distribuem após a morte de um ente querido).

– Que besteira, não vou escrever nada, porque eu é que vou morrer antes de você. E por favor, não escreva nada para mim, porque você é péssimo escrevendo – disse eu, tentando mudar de assunto.

– Não, você sabe que não vai ser assim. Escreva algo que retrate a minha forma de encarar a vida e a morte. Você convive comigo desde a infância e me conhece como ninguém. Escreva algo para aliviar meus pais e irmãos, para que eles aceitem melhor o que vai acontecer. Me prometa, por favor.

– Tudo bem, eu prometo.

Na verdade, meu querido amigo sabia que ia morrer, o que de fato aconteceu um ano e meio depois. Escrevi então o texto A Oração da Coragem, que acabou sendo impresso em seu santinho.

Hoje, 23 de outubro, seria aniversário dele, que faleceu com apenas 31 anos de idade. Em homenagem a ele, um guerreiro que lutou com dignidade rara até o último instante, deixo ao leitor amigo A Oração da Coragem:

Senhor, se preciso for, jamais me poupe dos dissabores da vida.

Não me poupe do trabalho árduo, porque ele é que dá sentido às conquistas.

Não me poupe das derrotas, porque elas ensinam mais que as vitórias.

Não me poupe do choro, porque as lágrimas podem lavar a alma.

Se preciso for, não me poupe da doença, porque ela maltrata o corpo mas purifica o espírito e me leva pra mais perto de Ti.

Não me poupe das tragédias, porque elas são a Tua vontade.

Não me poupe da morte, porque ela será o novo caminho.

Se preciso for, não me poupe de nada, porque tudo é prova ao que eu acredito.

Dê-me exatamente o que eu mereço, nem mais, nem menos.

O que vier, seja o que for, receberei com humildade, com resignação.

E sem fazer promessas, porque com Deus não se negocia.

Apenas agradeço por estar vivo e por saber que tudo é aprendizado.

Que tudo purifica, soma, ensina.

Sou grato por saber que o que tiver de ser será,

Que o que tiver de me pertencer, pertencerá,

Porque ninguém vive ou morre no lugar de ninguém.

Portanto, Senhor, agradeço por tudo e apenas faço um pedido:

Só não me deixe faltar a coragem.

Um abraço do Piloto X. Paz.



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