Por Luís Joly
Na mesma pista onde iniciou sua carreira, Michael Schumacher mostrou mais uma vez para nós que o tempo segue em sua missão de renovar tudo e todos. O alemão, que chegou em uma Fórmula 1 saída recentemente da era turbo, ingressou em um mundo ainda dominado por grandes nomes. Em Monza, 1991, ele superou ainda na classificação o veterano companheiro e tri-campeão Nelson Piquet. Se não teve responsabilidade direta pela saída de Piquet, certamente foi uma das razões que levaram o brasileiro à aposentadoria.
Schumacher passou, desde maio de 94, a reinar em uma Fórmula 1 sem estrelas – questão, aliás, sempre apontada em coletivas quando vem ao Brasil, e que costuma irritá-lo. Tornou-se rapidamente a figura meteórica no meio de coadjuvantes como Barrichello, Fisichella e Coulthard.
Sua imagem de piloto ágil, audacioso e calculista foi arranhada diversas vezes. Uma geração de fãs o viu fazer uso das manobras mais ardilosas possíveis. As fechadas em Damon Hill, em 94, e em Jacques Villeneuve, em 97, sempre serão lembradas em suas biografias. Assim como a barata tentativa de interromper o treino de classificação em Mônaco, este ano. Com a obtenção de garantir a pole, Schumacher acabou largando em último, e ficou sem um recorde que certamente gostaria de ter alcançado – o de vitórias em Mônaco. Este, ao menos, ficará ainda com Ayrton Senna.
Após a vitória na Itália, anuncia que sua carreira se encerra ao final do ano. A decisão veio, de fato, no melhor momento. Ele parece finalmente ter pesado na balança as vantagens e desvantagens em permanecer na Ferrari – ou na Fórmula 1. Os rumores de que a sensação finlandesa, Kimi Raikkonen, estaria na equipe italiana em 2007, já deixaram claro qual seria o destino do alemão. Afinal, se Schumacher teve companheiros impedidos por contrato de superá-lo, porque razão se arriscaria a enfrentar um garoto em ascensão a essa altura?
Durante mais de uma década, Schumacher foi a principal imagem da categoria máxima do automobilismo. Seu arrojo, suas ousadias e malandragens sempre estamparam jornais e revistas em todo o mundo. O sucesso – em parte, devido à tão propalada falta de estrelas -, o transcendeu de esportista bem sucedido, e colocou-o em um panteão muito mais especial – aqueles de lendas. Sua popularidade é tamanha que hoje, mesmo os que não acompanham corridas de carro com tanto – ou nenhum – fervor sabem quem é Michael Schumacher.
Sua ida a Ferrari, em 1996 – único ano em que não disputou o título diretamente desde 1994 – o consagrou como um dos maiores esportistas da atualidade. Serviu também para resgatar a lendária equipe, que à época era tão conhecida por sua marca como pelo jejum que enfrentava – um título de pilotos não vinha desde 1979. A parceria rendeu excelentes, doces e saborosos frutos a ambos. Vindo da Benetton, Schumacher passou de um bom piloto para um verdadeiro homem de recordes. E, para a Ferrari, ficou o registro de ter sido protagonista do período mais hegemônico nos mais de 50 anos de Fórmula 1 – de 2000 a 2004, ela e o alemão levaram de tudo.
A Fórmula 1 acostumou-se com Schumacher, o herói solitário que, por muitos anos, era o único campeão de verdade nos circuitos. Para o fim desta temporada, ele ainda pretende mostrar que pode encerrar de maneira ainda mais brilhante – suas 90 vitórias parecem não ser suficientes. Terá mais três corridas – China, Japão e Brasil – para que o mundo veja que sua fome de vitórias é maior que a do jovem campeão Fernando Alonso.
Caberá a nós, brasileiros, ter a honra de ser o palco de sua derradeira corrida. O mundo reserva suas passagens e sintoniza suas TVs para a despedida do alemão que, por tantos anos, simbolizou – às vezes, negativamente – a falta de competitividade e alta tecnologia que dominaram a categoria.
Antes disso, porém, certamente irá enfrentar a nossa imprensa.
E é bom que se prepare, pois as perguntas serão as mesmas de sempre.