Singapura em “modo forno”: alerta de calor, estratégias e chances do título de Verstappen

Norris, Leclerc, Russell, Ocon, Albon e Hadjar projetam corrida marcada por clima sufocante e equilíbrio no grid

Singapura chega com a primeira declaração oficial de “heat hazard” (alerta de calor) da Fórmula 1 e um pano de fundo técnico que envolve todas as áreas: gerenciamento físico do piloto, janela estratégica com pit lane mais rápido e um traçado que, desde o reprofiling do último setor, flui melhor e castiga menos o DRS. As entrevistas coletivas concedidas nesta quinta-feira (2) em Singapura, antes do início das atividades de pista para o GP de Singapura de Fórmula 1, reuniram pilotos para falar sobre os desafios do calor extremo, expectativas de desempenho e reflexões sobre a reta final da temporada 2025. Entre eles, Lando Norris, George Russell, Charles Leclerc, Esteban Ocon, Alex Albon e Isack Hadjar abordaram temas como a competitividade da McLaren, o ressurgimento da Red Bull, o duelo Ferrari x Mercedes, além de questões humanas como o retorno de Romain Grosjean a um F1 e a versatilidade de Max Verstappen correndo em outras categorias.

Em meio a isso, Norris manteve a confiança de quem considera Marina Bay “pista favorita”, Leclerc trouxe uma leitura pragmática do duelo Ferrari x Mercedes sob altas temperaturas, e Russell foi detalhista ao explicar como o colete de resfriamento influencia a pilotagem. A pauta humana também apareceu: o retorno de Romain Grosjean a um F1 reacendeu memórias fortes no paddock, enquanto a vitória de Max Verstappen no Nordschleife abriu um debate sobre polivalência e risco.

Norris: confiança em Singapura e respeito a evolução Red Bull
Norris abriu os trabalhos exibindo conforto com o cenário de Singapura e com o pacote da McLaren, mas sem subestimar o avanço recente da Red Bull. Em suas palavras: “Confiante. No ano passado foi muito bom aqui. Fomos muito fortes aqui no ano passado. Tive uma boa corrida, então sempre é legal. Eu sempre gostei desde o meu primeiro ano, em 2019. Então, no momento, parece que teremos um clima um pouco pior do que nos últimos anos, mas estou empolgado. É uma das minhas pistas favoritas da temporada.”

Ao avaliar a ordem de forças, Norris foi direto ao falar da Red Bull: “Genuinamente um adversário. Acho que se você voltar ao começo da temporada, eles estavam disputando as primeiras seis, sete corridas por vitórias, disputando conosco no Mundial de Pilotos. Depois trouxemos algumas atualizações, melhoramos um pouco. Algumas semanas atrás, eles trouxeram algumas atualizações e parece que isso meio que os colocou de volta no mesmo nível que nós.”

A leitura de Norris sobre o “segredo” de 2025 também apareceu com franqueza, valorizando a dupla da McLaren sem esconder os tropeços operacionais: “Você obviamente precisa do melhor carro. Acho que tivemos isso em 95% das corridas. […] Como construtores, esse é o ponto importante. Temos dois bons pilotos. […] Você precisa de dois pilotos que entreguem todo fim de semana, que terminem a maioria das corridas. E é isso que conseguimos fazer. Talvez não nas últimas duas, mas até aquele ponto fomos a dupla de pilotos com melhor desempenho. E claramente tivemos o melhor carro e fomos a melhor equipe.”

Singapura em "modo forno": alerta de calor, estratégias e chances do título de Verstappen
Foto: XPB Images

Russell detalha calor, colete de resfriamento e janela estratégica
Do lado da Mercedes, Russell atualizou o estado físico após Baku, comentou a obrigatoriedade do colete de resfriamento e projetou o equilíbrio em Singapura, sempre com ênfase técnica. Ele explicou: “Baku foi difícil em termos de como eu estava me sentindo. Não 100% agora. Melhorei bastante. […] Foi declarado um heat hazard pela primeira vez. […] Usamos o colete de resfriamento já algumas vezes nesta temporada nas corridas quentes. Mas, obviamente, é a primeira vez que se torna obrigatório, o que acho que é uma boa notícia. Nem todo mundo acha confortável, alguns acham mais do que outros. Com o tempo, você consegue ajustar às suas preferências. Mas o conceito é bom. Quando você está correndo com 90% de umidade e os cockpits chegando a 60 graus, é uma sauna dentro do carro. Então todos nós recebemos bem isso.”

Sobre o reprofiling do último setor e da velocidade no pit lane, aumentada para 80 km/h, foi objetivo: “A maior coisa para Singapura que melhorou a corrida foi remover as curvas do último setor. Agora, aquela reta de trás… como pilotos, você nunca quer remover curvas, mas antes tinha 20 e tantas curvas, e era demais. Agora o fluxo é muito melhor. […] No passado, sempre foi uma parada [nos boxes] só porque o pit lane levava muito tempo. Acho que agora está quatro ou cinco segundos mais curto com o limite de 80 km/h. Talvez vá mais para duas, mas recentemente muitas corridas têm sido uma parada. A chuva provavelmente será o próximo fator que vai apimentar a corrida.”

Leclerc: Ferrari depende do termômetro
A Ferrari, pela voz de Leclerc, foi realista com o potencial imediato e transparente ao correlacionar desempenho a condições de temperatura nas corridas restantes: “Não acho que possamos esperar milagres. Sinto que a McLaren terá ainda mais vantagem numa pista como esta, então podemos estar um pouco mais longe deles. No entanto, comparado aos nossos principais concorrentes, que são a Mercedes, devemos estar em uma posição melhor se continuar quente, o que acho que estará.” E fez a leitura-chave para a reta final do campeonato: “Sinto que a Mercedes é muito forte quando está frio, e parecemos ser mais fortes quando está quente. Olhando para as próximas corridas, espero que esteja o mais quente possível, para termos vantagem.”

Verstappen no Nordschleife e o debate sobre polivalência
O tema da polivalência ganhou corpo quando o paddock reagiu à vitória de Verstappen no Nordschleife. Norris foi só elogios: “É legal. É bom que ele possa fazer o que quer. Acho que depois de ganhar quatro mundiais, você tem um pouco mais de direito de escolher o que quer fazer. Eu já disse muitas vezes. Acho que ele nasceu para ser, e será para sempre, um dos melhores de todos os tempos, senão o melhor na Fórmula 1.”

Ocon ampliou o ponto com a própria rotina de treinos cruzados: “Fiz alguns testes e desenvolvimento em alguns carros no Nordschleife no ano passado porque queria aprender a pista. […] Faço muitas sessões de drifting no inverno, kart ou buggy. […] É útil quando você está em situações complicadas — na chuva, por exemplo. Você perde o carro em algum ponto, bem, mantém o olho treinado porque fez aquela curva e aquela situação um milhão de vezes no inverno em outros carros.” Albon trouxe a visão “ferramentas de vocabulário”: “Há muito a ganhar dirigindo carros diferentes — chame isso de ‘vocabulário’. Você lê um livro, aumenta seu vocabulário; dirige carros diferentes, aumenta sua ‘caixa de ferramentas’. Aprende formas distintas de ser rápido, técnicas, desafios, limitações e como contorná-las. […] Mesmo agora — kart, coisas diferentes, até rali, gelo — há muitas maneiras de se aprimorar para ser mais completo.”

Grosjean e a memória do acidente
No campo humano, a volta de Romain Grosjean a um F1 cinco anos após o acidente no Bahrein mobilizou memórias e emoções. Ocon descreveu o dia em Mugello: “Foi incrível. Era um grande dia em famílias com a Haas. Todos estavam lá para testemunhar o Romain pilotando um F1 cinco anos depois do acidente. Foi um dia de felicidade e emoções. […] Romain não perdeu nada. Estava no ritmo imediatamente.” Russell revisitou o momento da batida: “Para nós que estávamos na corrida e testemunhamos, ainda lembro até hoje. Ver as chamas no retrovisor — extremamente horrível de ver. […] Ninguém quer terminar a carreira daquela forma, então vê-lo ter a chance de voltar… foi legal para ele e legal da Haas dar a oportunidade.” Norris celebrou a reconexão: “Para ele voltar a um F1, seu sonho, e recuperar algumas boas memórias que tinha foi uma coisa legal para ele. Bom de ver.”

Haas, Williams e Racing Bulls no pelotão intermediário
A Haas, por sua vez, chega a uma pista mais amigável às características do carro — menos sensível a déficit de reta e com ênfase em tração e baixa velocidade. Ocon resumiu: “Geralmente, onde perdemos bastante é nas retas. Não há muitas aqui. Somos bons de tração, saindo de curvas, e baixa velocidade é decente. […] Vai ser muito apertado e o clima pode complicar.”

No pelotão intermediário, duas narrativas se cruzam. Hadjar, estreante em Singapura, vê Q3 como meta plausível, ainda que preferisse trechos de alta: “O carro está funcionando praticamente em todo lugar. É um carro saudável. Agora é baixa velocidade, como Baku. Eu preferiria uma pista com mais alta velocidade. Acho que combina mais com as características do nosso carro. Mas o carro vai funcionar de novo neste fim de semana, sem risco.”

E Albon detalha a evolução estrutural da Williams sob James Vowles e como isso se traduz em resiliência mesmo em pistas teoricamente desfavoráveis: “Eu diria que normalmente não é uma pista onde fomos bem, mas provamos este ano que não se carrega tanto do passado. Honestamente, assinei com a Williams e havia qualidades, mas não era óbvio que o time chegaria à posição atual. A maior mudança foi nos últimos dois anos, quando muitos elementos de base do time mudaram. O que você vê este ano vem de mudanças feitas há alguns anos.”

Singapura em "modo forno": alerta de calor, estratégias e chances do título de Verstappen
Foto: XPB Images

Pit lane mais rápido e o impacto na estratégia
Do lado da estratégia, o aumento do limite do pit lane para 80 km/h entrou no radar de todos. Hadjar foi conciso: “Talvez torne a duas paradas mais viável, no máximo. É menos tempo nos boxes. Melhor para a corrida.” Leclerc completou: “Vai ser mais rápido. Vai aproximar duas paradas de uma. Se vai mudar significativamente a estratégia, não sei. Continua sendo uma pista difícil para ultrapassar, então por isso você não quer parar tanto. Vai depender da degradação do pneu.” Albon concordou com a abertura de opções, mas ponderou o fator ultrapassagem: “É mais próximo — há mais opções agora — mas como disse o Charles, ainda é difícil ultrapassar aqui.”

Chances de Verstappen no título
E quanto às chances de título de Verstappen, a mesa oscilou entre o humor britânico e o pragmatismo. Russell, rindo, cravou “100%!”, enquanto Leclerc, Hadjar e Albon rondaram a faixa de 10% a 20% com um raciocínio comum: Red Bull forte em corridas com baixas cargas aerodinâmicas, McLaren projetada para voltar a ditar o ritmo em Singapura e em pistas de alta carga, e um gap de pontos ainda substancial para sete etapas.

Em síntese, Singapura promete ser mais que um GP sob calor sufocante. É um laboratório de execução: quem gerenciar melhor corpo e pneus, ler com precisão a janela que um pit lane mais rápido abre e navegar um fluxo de pista mais limpo, tende a contar a história do domingo. Norris chega com o conforto de quem normalmente voa sob os holofotes da Marina Bay; Leclerc mira o termômetro para virar contra a Mercedes; Russell vê um tabuleiro que favorece McLaren e Ferrari; Haas enxerga um respiro técnico; Williams se ancora na sua nova cultura. No pano de fundo, o retorno de Grosjean lembra por que a F1 é também feita de memória e gente; e a ida de Verstappen ao ‘Inferno Verde’ mostra que, no limite, pilotar é ampliar repertórios.



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